quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Idoso Maratonista: Até que ponto isso é bom?

Isso aqui é uma reposta ao post do Gentil que ele questiona “idoso maratonista – até que ponto isso é bom”. No post, ele elenca 4 pontos pelos quais ele se preocupa com idosos maratonistas, e na foto Gentil mostra um senhor correndo e a morte atras dele. Dos 4 pontos que ele elenca 3 são de um nivel de ignorancia assustadora. Ficou longo, mas esse post merece resposta.:
Ponto #1
“1) idosos têm naturalmente uma redução na síntese de fibras tipo II, mas não nas fibras tipos I, ou seja eles perdem mais fibras que fazem força e velocidade, o que é associado a perdas funcionais e também morfológicas. E todos sabemos que idosos com menor força e massa muscular vivem menos e também sabemos que o estímulo de baixa intensidade não previne esse quadro, pior, ele pode piorar o quadro!”
Envelhecimento diminui as fibras tipo II. Ao contrário do que ele diz, sim, existem diversos estudos mostrando que exercício de endurance aumenta massa muscular. As evidências são das mais variadas, e é inacreditável um PEF não as conhecer. Vou só colocar a figura sensacional do paper do Wroblewski et al. (2015) [1], que apesar de novo já é um clássico da literatura. https://michaelwoodspg.files.wordpress.com/…/psm-2011-09-19…
Nele você vê a diferença de massa muscular (medida com MRI e não com fita métrica como alguns metidos a “cientistas” fazem por aí) entre um triatleta e um sedentário de 70 anos.
E sim, massa muscular é inversamente associado com mortalidade. E sabe o que tb se correlaciona inversamente com mortalidade? VO2 pico/max e diversos medidas cardiorrespiratórias. E atletas de endurance Octogenários tem o VO2max muitíssimo superior que sedentários (imagem do post é desse paper) [2]. Ele se esqueceu ou nao sabe que esse tb é grande preditor de mortalidade. Quem pratica endurance de baixa intensidade sim tem maior expectativa de vida. Inacreditavel esse jogo de associacao falsa que ele faz.
Ponto #2
“2) idosos apresentam reduções progressivas na taxa metabólica de repouso, e isso é associado ao ganho de gordura, que leva a um quadro inflamatório crônico, com aumento da incidência de doenças metabólicas e cardiocirculatórias. Ah, a atividade de baixa intensidade e longa duração baixa ainda mais o metabolismo!!”
Terrorismo bioquímico puro, infundado. Essas associações (exercício de baixa intensidade->baixo metabolismo->ganho de gordura ->inflamação->doenças cardiocirculatórias) são de muita irresponsabilidade, sem embasamento científico, fruto de puro invencionismo, sem qualquer evidência científica. Cientistas da área, congregações e sociedades médicas e cientistas são unanimes em afirmar que a maior parte das causas de morte como doença cardíaca, diabetes, câncer, Alzheimer, são combatidas com atividade física, seja ela moderada, leve ou alta intensidade. O maior problema é inatividade. Novamente: afirmação sem amparo científico, ignora a literatura inteira, e é de extrema irresponsabilidade profissional.
Pronto #3
“3) idosos têm aumento da incidência de diabetes tipo 2 e mais da metade deles tem problema no metabolismo de glicose. Estudos indicam que atividades físicas de baixa intensidade e longa duração reduzem a quantidade de hexoquinase nas fibras musculares. A hexoquinase “aprisiona” a glicose na célula, ou seja, se você tiver menos dela, menos glicose fica no espaço intracelular e você será obrigado a liberar mais insulina, agravando o quadro metabólico. ”
Essa foi pra fazer Maughan – e qq professor de bioquímica do exercício – se revirar na cadeira. Exercício de baixa intensidade e longa duração reduzem hexoquina no músculo? Quando um camarada desses escreve “Estudos indicam” tenha certeza que nenhum estudo será citado. O que mais tem por ai também são evidencias de que exercício de longa duração aumenta expressão e atividade de Hexoquinase em sujeitos normais, diabéticos, obesos, idosos e no que mais voce quiser. Por ex. o artigo [3] mostra aumento considerável da atividade de hexokinase em obesos diábéticos com treino de endurance, maior que o treinamento de força, inclusive. O aumento de hexokinase em músculo com atividade prolongado é bem conhecido há décadas. Os grandíssimos pesquisadores John Holloszy and Frank W. Booth, há exatos 40 anos (1976) já falavam que hexokinase é aumentado com atividade prolongada [4]. Não apenas isso, uma maratona aumenta a atividade da hexokinase imediatamente após a prova e a mantêm elevada por 5 DIAS! [5].
Esse ponto específico, demonstra o baixíssimo conhecimento de bioquímica do exercício. Isso é matéria primária, daquele que é apresentado nas primeiras aulas de bioquímica do exercício. É conhecimento que se espera de um aluno de primeiro ou segundo ano de graduação em EFI. Se PEFs não conhecem a resposta ao treinamento sobre metabolismo de glicídios, ainda mais se tratando de uma enzima tão conhecida. Um doutor falar uma atrocidade dessas é patético. Simplesmente absurdo.
Além de tudo afirmar que endurance vai agravar o quadro metabólico do diabetes tipo II eh de uma insanidade e de um terrorismo bioquímico incomensurável. Os benefícios do treinamento de endurance sobre o diabetes tipo II são absurdamente bem documentados. Tanto dados populacionais/epidemiológicos, como dados fisiológicos/bioquímicos, como aumento de angionesese, biogênese mitocondrial, captação de glicose independente de insulina, etc etc etc... Maughan, Holloszy e Booth devem se sentir sortudos por não saberem português e não terem que ler essas imbecilidades.
[1] Wroblewski AP, Amati F, Smiley MA, Goodpaster B, Wright V. Chronic exercise preserves lean muscle mass in masters athletes. Phys Sportsmed. 2011 Sep;39(3):172-8.
[2]. Trappe S, Hayes E, Galpin A, Kaminsky L, Jemiolo B, Fink W, Trappe T, Jansson A, Gustafsson T, Tesch P. New records in aerobic power among octogenarian lifelong endurance athletes. J Appl Physiol (1985). 2013 Jan 1;114(1):3-10
[3] Rowlands DS. Multi-omic integrated networks connect DNA methylation and miRNA with skeletal muscle plasticity to chronic exercise in Type 2 diabetic obesity. Physiol Genomics. 2014 Oct 15;46(20):747-65.
[4] Holloszy JO, Booth FW. Biochemical adaptations to endurance exercise in muscle. Annu Rev Physiol. 1976;38:273-91.
[5] Sherman WM. Effect of a 42.2-km footrace and subsequent rest or exercise on muscle glycogen and enzymes. J Appl Physiol Respir Environ Exerc Physiol. 1983 Oct;55(4):1219-24.



 Escrito Por: Vandre Casagrande Figueiredo

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